O faroleiro lançava as suas redes ao mar.
Lançava as redes ao mar. Dando-lhes os gestos precisos, soltos, cumprimentados pelos borrifos de água das ondas encapeladas contra a sua roupa, contra o seu corpo. Contra a sua face de rugas duras.
Lançava e dava as redes ao mar contra a imensidão do céu verde e cheio de nuvens; contra a areia molhada, fria, a enrolar-se nos seus pés nus. Nas suas calças arregaçadas.
Nas mãos gretadas e vincadas pelos sulcos grotescos das dificuldades e dos trabalhos.
Contra os olhos semicerrados, contra o ar bondoso e compenetrado, contra a velhice e contra a solidão. Alicerces do farol.
Contra a tempestade que o crepúsculo traria antes de cair, devagarinho, nos braços da noite.
O faroleiro lançava as redes ao mar. Gostava de pescar.
Que fazes tu, faroleiro, que não estás no farol?, perguntou um menino que caminhava pela praia.
Estou a lançar estas redes ao mar para pescar peixe, respondeu-lhe o faroleiro. E já liguei o meu farol.
O vento virava-se e rebolava-se como as crianças traquinas; subia, descia, estava em toda a parte, brincava na rebentação das ondas. As redes eram recolhidas e não traziam nenhum peixe. O faroleiro foi tentando.
E porque pescas?
As nuvens engrossavam, as luzes nas casas, ao fundo, longe, longe; acendiam-se. Corriam-se os cortinados. Fechavam-se as janelas.
Pesco porque tenho de pescar. E porque gosto de pescar. Mesmo se não vier nenhum peixe. Vou pescando. Na esperança de receber alguma coisa do mar.
Mas pescador
E o menino foi-se embora. Brincar para fora da praia. Para outro lugar. O faroleiro sentia os seus suspiros murmurados, quando pegou nas redes, antes de novamente as atirar.
E foi aí que percebeu que estava velho.
No limite da tempestade.
Velho demais para voltar a qualquer antes, a qualquer atrás.
Então decidiu apagar para sempre a luz do seu farol.
E nunca mais contemplar o mar.