segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Provérbios Marítimos

Havia um provérbio da cultura atlante sobre um peixe e um pássaro que faziam pouco um do outro por um não saber nadar, e o outro não saber voar. Até que olharam um para o outro e perceberam o quão tolos eram. Este provérbio nunca existiu. Foi extraído de um poema que nunca existiu, pediu simplicidade e beleza emprestadas que o ficcionar de uma cultura não conseguem. Perdeu-se nas areias do tempo. Ou nas vagas infinitas do oceano da memória. Revolto e encapelado, as traições que nos faz. Havia esse homem que o disse, e havia o homem que o ouviu. Dualidades. Talvez tivesse sido um atlante, a afogar-se na água, imóvel, asfixiado pela água salgada, negra, nos pulmões. O outro homem lançou as suas redes e pescou um outro peixe. Vários desejos o peixe conferia, obrigado por não me teres pescado. O barco novo, a casa nova, o título de imperador, e a tempestade que se aproximava. Ao final da noite, voltou ao seu barracão.
Como sempre, as morais aprendem-se demasiado tarde.
Se escutares os ecos das ondas vais ver que os ecos são apenas outras ondas; tempestades por alguém/afogas-te num vintém. Mar e areia. Peixes silenciosos de discurso. As águas do oceano tudo levam, tudo apagam, e os discursos que evita dar contêm em si o condão fácil da morte. Que futilidade, termos um nome para o oceano. O peixe e o pássaro. O provérbio falso atlante não conta o que depois aconteceu. Um namoro improvável. Uma aprendizagem conjunta, seguida da morte de um, ou de ambos. Quão imperdoável pode ser o mar. Ou o nadar do peixe para bem longe da superfície, e o pássaro transportado para terra, pelas correntes amigas do vento. Assim terá, provavelmente, sido. Assim é sempre: a continuidade do percurso.
Não é preciso um farol para guiar um qualquer propósito pelo mar da vida.
Só é preciso um faroleiro.

Um comentário:

Anônimo disse...

“Everybody is a genius. But if you judge a fish by its ability to climb a tree, it will live its whole life believing that it is stupid.”
― Albert Einstein


lembrei-me disto quando comecei a ler sobre o peixe que não sabia voar e o pássaro que não sabia nadar. não sei porquê. e depois achei que o provérbio atlante acabaria com o peixe a compreender o pássaro e o pássaro a compreender o peixe.

na verdade comecei a ler isto a achar que era a parte 4. desolée... mas agora ainda mais curiosa.


S.