segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Aqui há uns anos atrás (na verdade foi Sábado passado) fui para o DOC Lisboa da mesma maneira que fui todos os anos. Alguém me convida, e eu pondero novamente porque é que não me lembrei que estava a decorrer o DOC Lisboa. No auditório pequeno passava um documentário sobre a música moderna nascida nos pelos anos 60 nos Estados Unidos e iam entrevistando o John Cage, narrando parte do documentário em francês com uma voz robotizada, ligeiramente irreal, Steve Reich, Terry qualquer coisa, La Monte Young, Phillip Glass, um inglês gordo e careca que gosta de compor madrigais, etc. etc. até acabar num gajo do techno de Detroit – o próximo passo; porque, supostamente, a música moderna tem como temas subjacentes o ritmo, o silêncio, a repetição. Composições dos artistas supramencionados têm esses temas, essas preocupações, como pedra angular das suas criações. O documentário passou deliciosos excertos. O La Monte Young manteve a barba, apaixonou-se pela composição indiana, e fritou de vez, todo ele grisalho e de cabedal preto; a Monk ainda usa longos totós e o Terry cenas e o Steve Reich cultivam o boné na cabeça. O jugo das peças dos compositores clássicos faz com que as composições de música contemporânea sejam postas de lado. São pouco tocadas, pouco ouvidas. A ditadura dos clássicos, diz-se. 

Um tipo sai destes documentários em que não espera nada com umas pequenas epifanias, uns pequenos buracos brancos dentro de nós cheios de vontade de preencher. Entre The Well-Tuned Piano do La Monte Young e uma rave qualquer em Detroit, gostei particularmente do excerto de Music for 18 Musicians. Demora cerca de uma hora. Podem pôr a tocar a partir dos 27 minutos. Ninguém vos condena.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Não ficção

As manhãs são passadas a olhar para a janela, lavar-me para me sentir limpo em conformidade com o mundo real, salty betting,

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mandar currículos, ver o céu nas nesgas por entre os prédios da cor do metal, net, Picoas, reler folhas escritas com a mesma caneta, e as tardes são passadas a enfrentar esse mesmo céu e um vento qualquer, escrever e ganhar esperança, e de repente caiu a noite -

Esperando promessas que fiz a mim mesmo

À espera.

Um futuro possível: quiseram que fosse dar aulas de inglês a putos do básico. Da segunda à quarta classe. De repente, ser professor - eu sempre quis ensinar, mas não ser professor de miúdos. As aulas seriam em Amadora - Falagueira, Reboleira. Voltava a casa, ou continuaria a ser um produto da roda contínua cujos sedimentos que vai triturando dos homens modelados assentam sempre no mesmo sítio.

Por outro lado: para a próxima, ficção.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A vida adulta, resumida.




The World is just a simple circle
You've got to keep on turning
Yeah
Got to keep on turning
Or down you fall

Na Praia

Fui à praia, ontem. Temos aquela ideia algo romântica, e - desconfiamos - mentirosa das praias vazias no Outono e no Inverno. As paredes da casa queriam fechar-se sobre mim e percebi que a manhã cinzenta ia dar lugar a um dia quente de Outubro, pela tarde. Já queria ir à praia há algum tempo nesta altura; um tipo inventa sempre uma desculpa para poder ver o mar.

E fui. Deve demorar-se o mesmo tempo ir à Costa ou a Oeiras, de minha casa. A Ponte sobre o Tejo está quase aqui ao lado. Quinze minutos de carro a uma Segunda-Feira ao início da tarde, se estiverem nuvens no céu e, calculo, seja Outubro. Sou uma excepção nestes caminhos, a estas horas. Nada me prende a nada. Vou-me sentindo um intruso cá fora na rua, a estas horas. É uma sensação estranha. É suposto não existirmos fora das nossas realidades profissionais - prédios, cubículos - entre a manhã e o final da tarde. A mim, esperava-me a praia.

Estava completamente vazia, aparte o surfista ocasional e um homem ou outro com o seu cão. Era exactamente o que tinha imaginado. O céu imenso, a maré vazia, o Sol a rasgar as nuvens finas e irregulares e a fazerem o mar ofuscar em remendos de luz. Fiquei por lá. Passaram por mim pescadores em tractores e pararam talvez um km depois. Li, olhei para o mar até me cansar, percorri o areal junto à agua. Os pescadores estavam a puxar as redes do mar, e centenas e centenas de gaivotas estavam no areal à espera. Fui até lá, e quando as redes estavam perto da costa todas as gaivotas levantaram voo.

Foi bonito.

Não ver o mar é algo que me angustia. Se não o fizer de vez em quando - não sei. Talvez seja só uma estupidez minha, uma idiossincrasia sem nexo. Eu gosto da Costa da Caparica, gosto do mar da Costa. O parque tinha aquela gravilha e aquele pó branco que não vejo em mais lugar nenhum. As ervas tentam nascer e crescer naquele solo estéril, fustigado pela areia e pelo sal. E o mar, o mar. O mar. A maré vazia, o areal extenso, o Sol a exigir-se como sagrado, rasgando as nuvens que cobriam quase todo o céu.

Uma confusão de gaivotas, cães excitados, e pescadores indiferentes aos cinco, seis mirones que se juntaram para verem a apanha do peixe. Fiz o mesmo, andei mais, e depois voltei.

Fiquei quatro horas na praia, a ler, a andar, a ver o mar, a emocionar-me com os sons apenas essenciais. Queria ter voltado a pé para casa, chegar esgotado a meio da noite e atravessar a ponte olhando para o Tejo e para Lisboa à minha velocidade.

Acho que mais do que ser escritor, gostava só de poder observar as coisas até me esgotar nelas. E, assim, percebê-las à minha maneira.

Regressei, deixei o mar para trás, e voltei a falar com a boca.