domingo, 16 de fevereiro de 2014

sábado, 15 de fevereiro de 2014

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Viciado em Escritos

Hoje vi um gajo à entrada do metro com uma máquina de escrever; eu passei por ele de fato, sobretudo e gravata. “sou viciado em escritos”. Sentado de pernas cruzadas no chão, como eu faço, pelo canto do olho papelinhos dobrados dentro de copos. Huh-huh. Boa ideia pensei, boa ideia pensou o gajo de fato e gravata a andar devagar por causa da chuva, boa ideia, se um metro chega de 7 em 7 minutos e de 7 em sete minutos saem umas quarenta ou 50 pessoas da estação e se cinco ou seis te derem uma moeda é um papel por minuto, escrito freneticamente e pelo menos portanto cinco ou seis boas ideias retiradas do éter e liquidificadas em tinta, tudo bem. Era um bom exercício. Chegar e sentar-me com o cu no chão e sacar da minha máquina de escrever que não tenho e começar a escrever, a cabeça gradualmente a baixar-se cada vez mais e a ignorar as pessoas que passavam e agradecendo com um sorriso as moedas; 20, 30 euros por dia se fosse variando as estações? Bem capaz, limpos, brutos, sem serem dedutíveis nos impostos. Depois vem aquele momento de nojo e medo, estás tu muito bem a escrever e aparece-te (a meio do dia, na estação, está-te tudo a correr bem não o esperas de todo) um tipo qualquer da faculdade onde andaste que pára à tua frente sem ter bem a certeza se és mesmo tu, quer dizer como é que é possível e hesitam um pouco antes de dizerem, a sorrirem com uma incredulidade indisfarçável João…? És tu ou Que é que que estás aí a fazer?, e depois tu tens que lhe(s) explicar que não a sério, por mais que sorrias, que digas Isto foi mesmo uma escolha ninguém te vai perceber, mais uma vez considerado maluquinho e um tipo que vai ser sempre um falhado na vida pela forma como escolhe enfrentá-la e tu não estás sequer para explicar pela centésima, milésima vez que foda-se qual é o mal de se ter um pouco de confiança nas pessoas e ignorar o resto; que só é preciso um pouco de carinho e que escrever – que só quero fazer escritos porque Sou Viciado em Escritos e faço até tipo 20 ou 30 euros por dia e devia ser considerada uma coisa tão honrosa quanto andar por aí a olhar-se para um pc no escritório e fazer piadas junto à máquina de café, o céu num vórtice, as nuvens a gritar mas ninguém as ouve, e por vezes penso nisso e mais do que não poder viver a vida toda a escrever coisinhas em papéis dobrados em copos de plástico fico triste por saber que ninguém vê o céu azul, por vezes, a engolir a cidade, ou as nuvens a girar e a gritar e o Sol a escorrer pela tela lá em cima, sem suspirarem por voltarem a entrar em edifícios que conhecem. É um bocado fodido.


Isto de escrever.